Correndo na Flip

FP_Rodrigues_VB_05_julho_16

Há quem não curta a Festa Literária de Paraty, por diversos motivos que não vou listar aqui, mas que a leitora pode encontrar facilmente no google, caso queira perder tempo com isso. Eu não perderia. Mesmo porque quase sempre que ouço ou leio críticas ao evento observo nas entrelinhas um tipo de efeito plunct-plact-zum: o que eu queria mesmo era ir com vocês… Inclusive é curioso ver autores que tanto criticavam a “micareta de intelectuais” de repente circulando pela cidade e registrando a presença com as inevitáveis selfies. Acho que todo mundo que tem alguma ligação com livros, no fundo, gostaria de estar por lá.

Não há como negar que a Flip apenas trouxe contribuições para a cultura brasileira ao longo desses 14 anos. Inspirou dezenas, talvez centenas de eventos de menor porte no país, tendo como marca a ideia de festa, como diz o nome, e colocando o autor como protagonista. Creio que contribuiu para alterar inclusive as mastodônticas bienais do livro, tradicionalmente compostas pelo enfileiramento de estandes, e que hoje exigem cada vez mais uma programação que permita o encontro entre autores e leitores.

Mas isto aqui é uma crônica, oras. E quando o cronista passa vários parágrafos falando de coisas gerais, entrega que está praticando um tipo de psitacismo enquanto não chegam as particulares, assuntos que realmente nos interessam aqui. Estatísticas e estudos muito intelecutalizados sobre o assunto a leitora pode encontrar nas melhores casas do ramo.

Por isso, enquanto ainda retomo o fôlego depois da minha 14ª visita ao evento, solto um rol de breves registros do que foi a minha Flip em 2016:

1 – Enquanto entrava na mesa de abertura, a única que consegui assistir, encontrei o cronista Humberto Werneck. Ele me olhou e perguntou: “Você não é o Josenildo?” Só um grande cronista começaria um papo com esse nome. Após me identificar como colega de Vida Breve (“sou o das terças, você das sextas; não me reconheceu de imediato por conta dos dois dias do meio”), sentamos juntos e papeamos. Quando o curador da Flip entrou no palco para abrir o evento, ele disse todo orgulhoso ao ver o filho: olha lá, meu parceirão.

2 – No restante dos dias fiquei praticamente de 10 às 22h no espaço do Sesc, onde fiz parte da curadoria, termo que está na moda e parece legal para quem está de fora, mas que na prática significa estar sorrindo todo o tempo para público e artistas enquanto a mente se preocupa incansavelmente com inúmeros detalhes de bastidores.

3 – Ou seja, mal consegui sorver a própria programação que ajudei a organizar. Do céu não se vê o céu, como dizia, se não me engano, o Paulo Mendes Campos. Mas reclamar disso seria uma grande injustiça.

4 – Participei de um papo na programação paralela com o meu amigo e também vida-brevesco Marcelo Moutinho, que a leitora encontra aqui aos sábados. Foi emocionante lembrar em público da nossa primeira Flip, quando só dividíamos mesa de bar. E foi numa mesa de bar, o Coupé, onde fomos comemorar depois. Tradição não se discute.

5 – Ouvi que a Flip diminuiu, mas a minha parece que apenas aumentou.

6 – O evento, mais que uma sequência de palestras, é uma sucessão de encontros. É mais um acontecimento das ruas do que de palcos.

7 – Por isso é que entre ir do ponto A ao ponto B paramos várias vezes ao esbarrar com um conhecido, que nos apresenta outros, comenta-se tal assunto e está iniciada uma pequena reunião, da qual devemos sair correndo tão logo nos lembremos do ponto B. E um trajeto de 300 metros pode levar 20 minutos e 5 rodas de conversa para ser percorrido.

8 – E ao fim de cada encontro dizemos: “vamos marcar um café com calma amanhã”, na vã esperança de que isso aconteça.

9 – Senti falta de encontrar o meu amigo Delfin, escritor e designer paulista que encontro todos os anos por lá. Escrevi uma crônica sobre ele aqui (https://www.henriquerodrigues.net/archives/429). A Flip sem o Delfin pode ser o fim de uma era.

10 – Fala-se em crise. E ela vemos aqui no mundo real. E talvez por isso mesmo é que a Flip e a literatura como um todo são cada vez mais fundamentais para mantermos a sanidade. Ou a insanidade necessária para sobreviver neste mundo doido. Até 2017!

Comente

Assunto Sem categoria

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *